VIII - algumas reflexões sobre Cidadania







“Regra absoluta de uma alma livre: nunca aclamar um senhor governante, seja este liberal ou não seja; por maioria de razão, nunca ser tímido dele, não sentir por ele “instintivo respeito”, ou “temor aflito” ante o seu contacto: mas conservar uma atitude ( desprendida ) crítica, ainda que concordemos com a sua obra, ainda que o ajudemos na sua acção.
As almas libertas – as bem nascidas – só se comovem interiormente se inclinam ante as puras grandezas espirituais, quando desacompanhadas de qualquer poder.
Num Marco Aurélio, veneramos a nobreza do filósofo estóico, não veneramos o imperador de Roma”.


- António Sérgio




em Portugal ,porém ,face à passividade geral ,os homens do poder ,porque eleitos ,ditam as suas “leis” e aplicam-nas em nome da representatividade
.são venerados como eleitos para – e como se estranharia se não cumprissem essa função – condicionar o comportamento da sociedade .e esta ,por “instintivo respeito” ou “temor aflito” ,inevitavelmente ,estereotipada e amorfa ,vai perdendo ,cada vez mais ,influência
.é ,então, que por artes de magia ,os eleitos promovem ou patrocinam espectáculos circenses alienatórios das massas ( já de si alienadas ) que ,impulsivamente ,aderem à festa
.há ,no entanto ,os resistentes
.aqueles que embora em minorias – culturais ,sociais ,políticas e intelectuais – buscam o essencial ,marginalizados do complô compulsivo do poder .fazem jus ao seu imaginário ,cientes de que ,em momentos de crise ,são as minorias que ,tendencialmente ,invertem os jogos do poder enquanto tal
.já é tempo de a Cultura ser considerada na sua dimensão fundamental – não como um somatório de experiências “velhas e inúteis” ,mas como um modo de estar e de intervir ,como um ponto de partida ,e ,sobretudo ,como um impulso para uma procura inventiva de novas possibilidades de progresso e desenvolvimento humanos
.todavia, o trabalho que permite vencer o isolamento ,a apatia ,o individualismo ,o passivismo e fomentar uma atitude criativa e crítica ,não se concilia com o desejo que anima alguns eleitos ,de obter resultados rápidos e imediatos
.passivamente ,continuamos a não interiorizar os nossos valores essenciais ,a não exigir a preservação dos nossos símbolos ,suportes presentes da nossa história colectiva ,logo ,da nossa identidade como povo
.face ao inegável ,há ,contudo ,quem resiste ,encontrando nas palavras de Miguel Torga ,a justificada fuga ao efémero – “Bem quero, mas não consigo alhear-me da comédia democrática que substituiu a tragédia autocrática no palco do país.
Só nós!
Dá vontade de chorar ver tanta irreflexão. Não aprendemos nenhuma lição política, por mais eloquente que seja.
(…)
Quando temos oportunidade de ser verdadeiramente livres, escravizamo-nos às nossas obsessões. Ninguém aqui entende outra voz que não seja a dos seus humores. É humoralmente que governamos, que legislamos, que elegemos. E somos uma comunidade de solidões impulsivas a todos os níveis da cidadania.
Com oitocentos anos de história, parecemos crianças sociais. Jogamos às escondidas nos corredores da vida.”
.é tempo de pô-lo em prática ,assim o exige o nosso ser/estar social.




Março ,2017
Gabriela Rocha Martins